Novos gestores, velhas políticas

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O que deve ser levado em conta na hora de escolher um chefe do Executivo são os conteúdos programáticos de cada candidato

”Não sou político, sou um administrador, sou empresário, sou gestor”. Esse tipo de afirmação, muito comum nos tempos de Paulo Maluf, e agora novamente em voga na boca de políticos como João Dória, Geraldo Alckmin e similares, mascara um detalhe importante: administração ou gestão são atividades-meio.

Em razão de seu caráter instrumental, jamais poderiam ser consideradas um critério confiável para se escolher chefes do Poder Executivo. Quando o lema de um político é a gestão, significa que está de mãos vazias. Além de ser uma afirmação interessada e parcial a respeito da própria capacidade de gerir, o que configura um conflito de interesses, dada a proximidade máxima de alguém consigo mesmo, uma boa gestão, por si só, não garante o devido atendimento ao interesse público.

Campos de concentração eram conhecidos pela suaexcelência administrativa, precisão logística, eficácia em exterminar inocentes e eficiência em cometer atrocidades das mais variadas ao menor custo possível. Auschwitz, para os nazistas, era considerado um caso de sucesso gerencial.

Organizações criminosas podem ser bem geridas. Indústrias que se utilizam de mão de obra análoga à escrava ostentam significativas reduções de custos. São produtivas. Fazem mais com menos. O uso de drones em cruéis bombardeios injustificados também pode ser eficiente.

Portanto, o que deve ser levado em conta na hora de escolher um chefe do Executivo, seja nas prefeituras municipais, nos governos dos Estados ou na presidência da República, são os conteúdos programáticos de cada candidato. A pergunta central a ser respondida não é “como fazer” mas sim “o que será feito”.

Em outras palavras, a questão que se coloca é: quais as políticas públicas que um candidato pretende implantar, uma vez eleito, no interesse da população. Antes de se fazer certo a coisa, é preciso fazer a coisa certa. A boa gestão é sempre bem-vinda. É condição necessária, mas não suficiente para o exercício de um mandato eletivo.

Diferentemente de uma empresa privada, no setor público a eficiência econômica deve estar sempre subordinada à eficácia social. Se em qualquer momento algum “trade-off” tiver de ser feito, é muito melhor que se sacrifique uma parcela da eficiência em benefício de um atendimento à população mais igualitário e universalizado.

Cortar programas sociais não é um indicador de gestãoeficiente. É sinônimo de covardia do administrador e revela falta de compromisso com seus administrados. Sobretudo em um país com tantas carências materiais e injustiças distributivas como o Brasil.

Assim, precisamos estar vacinados contra argumentos falaciosos dos autointitulados “especialistas” em gestão. Passamos do prazo de sermos tão ingênuos. Negar a política e concentrar os discursos nas ações acessórias para acobertar a falta de propostas sólidas é um expediente ardiloso. Não passa de um jeito sórdido de fazer má política.

A embalagem pode até ser nova. Mas a tática é velha. E, ao que parece, ainda tem iludido milhões de eleitores incautos. Massas seduzidas pelas promessas vazias de uma vida dominada pelo admirável mundo da técnica, onde ambicionar o consumo de roupas de grife seria a expressão máxima do valor da cidadania.

Fonte: Carta Capital